terça-feira, dezembro 06, 2005

Eu, a erística e o lance filosófico

Aquela afirmação, de que a filosofia estava dentro de nós, me tocou. Eu sempre pensei que todos temos nossos a prioris e que, ao longo da vida, tentamos angariar argumentos menos para comprová-los que para defendê-los. Muitos são bem sucedidos nessa empreitada e outros, ao fim, consideram-se desacreditados. Existem os que afirmam ter visto o absurdo do mundo, e todo o seu desencantamento, e abandonam a filosofia para todo o sempre.

Já comigo é diferente. Tento não me partidarizar. Gosto de ver o jogo filosófico da arquibancada. Deixo o show pros jogadores, reservas, técnicos e toda a parafernália anexa. Estou lá, na minha torcida prostituta, que troca de camisa a cada lance. Não é a minha vida que está em questão, ou minhas crenças. É só um jogo.

Finda a partida, eu volto pra casa feliz e decepcionada. A felicidade vem pelo show, a decepção vem por conta do fato de não haver time perfeito. Somados todos os belos lances do campeonato, ter-se-ia a partida perfeita; somados todos os bons jogadores, o time perfeito. Somadas as qualidades: o jogador verdadeiro. E meu sentimento é uma angústia sem fim, porque, se eu tentasse abolir a decepção, não haveria espetáculo. Se houvesse o time perfeito não haveria campeonato.

Ao final de cada tratado filosófico ou de cada aforismo sábio, fico feliz e decepcionada por sentir o sabor da resposta, da antítese, da incompletude.

Para não ser obrigada a tomar partido e me decepcionar ainda mais, eu escolho torcer pelos lances, sem muita fidelidade aos seus superiores, sejam eles jogadores, times, partidas ou campeonatos. Sejam eles idéias, livros, autores ou teorias. Minha filosofia trintona cansou de esperar pelo príncipe encantado e anda por aí em busca do prazer barato de uma idéia bem articulada. É uma ricaça que sai, anônima, pela noite, escondendo-se em cortinas de fumaça e elegantes taças de Martini, em busca de jovens rapazes recheados de convicções. Pelo prazer instantâneo de um beijo e nada mais. Ela se entrega a qualquer sacada genial.

Se eu tenho convicções? Não sei. Apetecem-me as alheias. Mas não me apaixono não, porque já sou apaixonada, secretamente, por tudo, numa deliciosa banalização.

Hoje sinto que nasci com toda a filosofia dentro de mim. E ela me fez rir do absurdo do mundo.